terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Retorno à Ilhabela - Saco da Capela

Diário de Bordo do dia 14 de fevereiro de 2009.

Após uma noite de chuva, a quinta-feira não amanheceu diferente. A chuva nos prendeu dentro do barco, não que não conseguíssemos desembarcar, mas o dia acinzentado não nos convidava à nada.

Aproveitamos e colocamos algumas coisas para funcionar. O inversor, agora de 3000 Watts, que imaginávamos estar roubado toda a energia de nossas baterias de serviço, deixou de ser o vilão quando descobrimos a falta de um interruptor que permite os alternadores dos motores carregarem não apenas as suas baterias com as de serviço. Assim que o Ricardo o colocou, nosso voltímetro que estava em quase zero, pulou para os 16 Volts.

Religamos o inversor e vimos o forno elétrico ganhar vida e pudemos usar e abusar do laptop. Que coisa, ficamos sem energia elétrica por que alguém tirou uma das alavancas do interruptores. Assumo minha "mea-culpa", mas são certas coisas que me deixam pensando. Não basta ter alguém (o mesmo alguém) apenas preocupado em lavar o barco quando voce decidi descer para a marina. o barco tem que ter um marinheiro para chamar de seu (plagiando a música do Erasmo).

O Ricardo inspirado, fuçou na parte elétrica do painel e arrumou várias coisinhas enquanto eu mexia em outras coisas.

O Gutinho, bom o Gutinho...dormiu quase a tarde toda, mas acordou a tempo do café.

O Gutinho fazendo o que sabe fazer de melhor...

A noite fomos comer uma pizza no deck turístico da Vila e retornamos em meio a um leve chuvisqueiro.

Na manhã seguinte, dia 15 de fevereiro, novamente o dia amanheceu chuvoso e fizemos uma tentativa de retornar para o Guarujá. Saímos bem cedo do Saco da Capela e colocamos a proa em direção a saída sul do canal. A turbina de BE, que antes estava com 0,5 Kg, agora não estava dando nada. Demoramos quase um hora para chegarmos até a Ilha de Toque-toque. Ricardo e Gutinho permaneciam calados como adivinhando meu estado de humor.


Dado momento, ainda antes de ultrapassar Toque-toque, tomei a decisão de retornar até o Saco da Capela e tomar outras providências.


Não podia e não colocaria em risco as vidas ali sob minha responsabilidade. Gutinho me confidenciou mais tarde que tinha certeza de que eu ia retornar, talvez creditando à minha decisão sua própria opinião do que fazer.


Chegamos ao saco da Capela por volta das 11:00 hs e providenciei para que Gutinho voltasse até a marina de ônibus, pegasse nosso carro e voltasse até onde estávamos ancorados. Liguei ao Adailton e relatei o que ocorria, orientado-o de que viesse até o local na segunda-feira, pois deixaria o barco na bóia do Almir e retornaria de carro até a marina, a tempo de me encontrar com a Rita e a Nathalie, que estavam em nosso apartamento na Praia Grande (cidade de Praia Grande).


Minutos depois o Adailton retornou a ligação dizendo que iria aproveitar para subir com o Gutinho de carro, e que levaria o barco ainda naquele dia. Fiz algumas conta para ele em termos de tempo e combustível e afirmei que chegariam depois da meia noite, pois até chegarem em Ilhabela, já seria mais de 18:30 hs.


De qualquer forma, o Adailton veio de fato com o Gutinho, decidido levar o barco embora. O Ricardo que já havia manifestado interesse em ir conosco de carro, acabou tendo que permanecer na embarcação, para auxiliar o Adailton. Mais uma vez insisti que não fosse então naquele horário, mas aguardasse ao menos até o dia seguinte, para irem durante a luz do dia.


Saíram do Saco da Capela por volta das 19:00 hs e Gutinho e eu fomos nos hospedar na Pousada do Capitão, haja vista que o cansaço e o estresse do assunto nos haviam consumido a energia. CAlculei que uma noite bem dormida seria mais importante e recompensadora do que uma empreitada noturna pela estrada entre São Sebastião e Bertioga ( a BR 101, que alli se chama Rodovia Cônego Domenico Rangoni) que tem cerca de 70 Km de curvas.


21:00 hs, preocupado, liguei para o Adailton e a ligação não foi atendida, liguei para o Ricardo e o Adailton atendeu, dizendo que não conseguiu responder a tempo. Me falou que estavam passando pelas Ilhas (Ilha das Couves e da Baleia) já próximos do Montão de Trigo. Achei estranho, pois isso fica a meio caminho de casa. Apenas duas horas depois da saída...perguntei como estava o motor e ele me afirmou que o turbo de BE estava dando 0,5 Kg! Pensei: voltou a funcionar mal, mas ao menos funciona.Pedi que me ligassem quando chegassem na Marina, mas o cansaço não me deixou ouvir a chamada por volta das 02:00 horas.


Sábado de manhã, dia 16 de fevereiro, fomos embora e quando estava embarcado na balsa de travessia, liguei para o Adailton, retornando a ligação da madrugada. Ai a coisa pesou. Ele me disse que a rabeta de BB (a do motor bom) havia quebrado e que navegaram apenas no motor de BE (o ruim, por que estava sem turbina, não que estivesse com problemas mecânicos), e que quando chegaram na marina, por volta das 02:00 hs (horário da ligação), e colocaram esse motor no neutro para realizarem a manobra de atracação, o distinto não quis mais pegar.


Fico em dúvidas de cmo conseguiram tirar o barco da água...um motor neutralizado pois não pegava e o outro sem poder funcionar por que estava com a rabeta quebrada...


Bom, com a boa notícia, liguei ao Renato, mecânico que trocou os motores e pedi sua ajuda. Ele marcou no domingo para conversarmos na marina.


Quando cheguei por lá, ainda no sábado, e fui ver o estrago, fiquei muito triste. Imaginei que muito daquele estrago poderia ter sido evitado se o Adaílton me ouvisse. Tenho certeza de que no dia seguinte, ele ia querer avalliar melhor a situação e dependendo do que visse, poderia pedir ao Renato para olhar o motor ainda em Ilhabela, mas...deixei a coisa aconstecer.


O que mais me impressionou e me deu certeza de que havia algo errado foi o silêncio dos marinheiros na marina. Alguns até me evitaram, disfarçando uma mudança de caminho para não me confrontar. Creio que imaginaram o que já devem ter visto inúmeras vezes antes por parte de outros proprietários - um baita de um escândalo. Confesso que deu vontade de falar um monte de coisas, mas creio que seria inócuo.


Falei de uma forma um pouco mais firme com o Adaílton e sai de perto. Vários colegas proprietários vieram dar suas opiniões do que poderia ter acontecido. O Roberval chegou a uma conclusão mais próxima do laudo do Renato. A rabeta não quebrou por ter batido em alguma coisa. Em sua opinião teria sido a cruzeta que estourou de dentro para fora e quebrou o capacete da rabeta.


Na verdade também não foi a cruzeta, mas outras engrenagens que se romperam e quebraram o capacete da rabeta. Na verdade o motor MWM sprinter de 260 Hp tem um giro muito forte e a rabeta tende a não aguentar. Só precisa usá-lo com uma rotação mais baixa. O problema é que apenas ele estava funcionando, carregando o outro sem turbo nas costas, portanto deve ter sido mais exigido a medida que a distância entre Ilhabela e Bertioga não diminuía e a noite ia madrugada a dentro.


Com seu rompimento, tiveram que usar o motor sem turbo, que na verdade estava com uma entrada de água nos sistemas. Quando o desligaram, a coluna d'água não permitiu mais sua ligação.


Bom, na reunião com o Renato, expliquei os problemas, inclusive da falta de dinheiro, mas da necessidade de se consertar a embarcação, pois estamos olhando outra para negócio.


O Renato se prontificou a ajudar e simplesmente decidiu levar os dois motores (o bom e o ruim) e as duas rabetas (idem) para conserto e regulagem, além da pintura da rabeta, pois sua imersão acaba trazendo certas consequências, como a tinta que é atacada pela oxidação.


Agora estou sem barco, ao menos por algum tempo, mas tenho certeza de que em breve estarei novamente navegando pelos mares do sul.


Assim, até que isso ocorra, vou me dedicar a procurar outra embarcação. Na verdade já olhei duas e gostei muito de uma delas, de 36 pés.


Vou deixar um filme de nossa chegada à Ilha Anchieta, na Praia do Sul, mostrando o local. Espero que gostem.

Boa navegação à todos!

Capitão Amador Gutemberg
Comandante da embarcação Rei dos Reis

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Saco da Ribeira

Diário de Bordo do dia 13 de fevereiro de 2009 - 4ª feira

Depois de uma noite muito agradável no Saco das Palmas, defronte à antiga colonia prisional, amanheceu um dia (mais um dia) maravilhoso. O mar ali nem se mexia.


Levamos a embarcação até o pier, e a reabastecemos de água e aproveitamos para dar uma lavada no convés. Arrumada as coisas recebemos um convite irrecusável: tomar um cafezinho preto feito na hora. Fantástico! Amante de café como sou...


O Zico havia preparado o café e com sua hospitalidade (como dos demais), relaxamos batendo um papo dos melhores. Vi que o Zico, o Carlinhos e Benedito estavam com as malas preparadas para irem para o continente. Já haviam cumprido sua jornada de quatro dias de serviço e agora desfrutariam de mesmo período em casa.

Como tínhamos que ir até o Saco da Ribeira, oferecemos carona. Embarcados, zarpamos, nos despedindo de Rene, que estava agora em segundo dia de serviço, não sem antes combinarmos um churrasco na Praia do Sul.

Começamos a rumar para o Saco da Ribeira e não consegui deixar de pensar em um episódio particular da dita rebelião, quando um dos soldados em serviço naquele fatídico dia, ao se perceber da anormalidade e das atrocidades que ocorriam, nadou através do boqueirão que separa a Ilha Anchieta do continente. Nada, nada, são ao menos quinhentos metros...o problema que naquela ocasião, a ilha que também era conhecida como Ilha dos Porcos, pelo fato de seu moradores criarem suínos, possuiam o hábito de jogar as entranhas dos animais abatidos exatamente no boqueirão, com a finalidade de atrair tubarões (o que de fato ocorria) para pesca e para dificultar a fuga (justamente) a nado da ilha pelos sentenciados. Pois exatamente nesse cenário, o heróico soldado nadou em busca de ajuda aos demais.

Vencido o pequeno trecho, rumamos para o interior da enseada e fomos chegando ao dito Saco. Bem próximo do canal de acesso ao interior do saco, repleto de barcos ancorados, perdi completamente o leme. Olhei para o Ricardo e mostrei por sinal. Ele rapidamente foi até a bomba do hidráulico e não conseguiu resolver o problema. Notificquei aos demais passageiros do problema e que iríamos encerrar nossa navegação manobrando apenas com os motores. Como dizem no mar, quem tem dois tem um, quem tem um não tem nenhum, tratando-se de motores.

Manobra daqui e dali, ancoramos em segurança bem ao fundo do Saco. O Ricardo rapidinho foi verificar o nível do óleo hidráulico e percebeu que estava baixo. Nesse interim, eu estava no pier e já tinha sido apresentado a um marinheiro de uma das escunas que ali existem que ligou para um mecânico que atende por ali. Ricardo me sinalizou que não havia necessidade, pois já havia descoberto o problema, mas não teve jeito. Como do nada surgiu o Roberto, mecânico do local.

Subiu a bordo, e com seu tamanho privilegiado, em cada movimento dentro da embarcação a fazia adernar. Laudo final: faltas de óleo no hidráulico. Colocou 1 litro e me cobrou R$ 30,00 pelo atendimento. Achei justo, o leme voltou e ele ainda descobriu que o leme do fly está com a caixa sem função. Isso me fez lembrar do Adaílton...

Aproveitamos, o Gutinho e eu, para irmos ao supermercado completar alguns itens de nossa dispensa (miojo) e comprar mais óleo hidráulico, pos apesar de não ter sido encontrado nenhum vazamento (de fato não há), sempre é bom prevenir, quando se está no mar.

No mercado, percebi que havíamos exagerado um pouco nas compras, e como o mercado não era tão perto assim do pier, conseguimos que um garoto levasse nossas compras de bicicleta. O problema é que ele foi na nossa frente. Só faltava errar o barco e fazer algum pescador feliz.

Iniciamos nossos procedimentos de saída e paramos no posto flutuante que existe ali. Reabastecidos, saímos e voltamos à Praia do Sul, onde preparei uma fraldinha no ponto de deixar qualquer um com inveja. Carne macia, saborosa, no ponto, cerveja gelada e o cenário da foto, não tem como não ser feliz.

Visão da Praia do Sul


No meio do churrasco, o Gutinho me trouxe a notícia de que o Ricardo estava sentindo dor de dente. Perguntei desde quando, e fiquei surpreso ao saber que era desde o primeiro dia. Juntamos as coisas e embarcamos tudo, sem ao menos esperarmos os colegas Rene e Carpinati, despedindo-nos do Seo Joel e pedindo que ele explicasse o desencontro, mas não queria correr o risco de dormir por ali mais uma noite e o Ricardo ter uma crise de dor de dente longe de algum local de socorro.


Gutinho e Ricardo em nosso retorno à Ilhabela

Nossos amigos e anfitriões, Rene (esq) e Carpinati (dir)



Levantamos o ferro e rumamos para a Ilhabela. No meio do caminho, comecei a observar um aguaceiro que caia sobre Caraguatatuba. Como nossa velocidade era pouca, em torno de 17 a 18 nós, fiquei temeroso que aquela chuva nos alcançasse em pleno mar. Provavelmente se isso ocorresse, teríamos que fazer uma curva para BB e teríamos que ficar rodando por ali até que ela passasse, pois seria impossível acharmos o canal de Ilhabela sem visualização, ainda mais que observava uma grande cargueiro ancorado em sua entrada. Mas de qq forma, tudo correu bem, pois conseguimos adentrar ao canal em segurança e retornamos à mesma poita anterior.

Único problema foi que um catamarâ que fica mais na parte externa tin ha se deslocado bem róximo da bóia pretendida por nós, mas sem maiores problemas ancoramos.

Como o Almir e a Míriam, proprietários das bóias estavam por ali, conversei a respeito de onde poderia encontrar um dentista para atender aquela emergência. eles prontamente nos ajudaram e inclusive nos deram carona, haja vista que a essa hora já chovia sobre a bela Ilhabela.


Improvisamos uma capa extra para a embarcação por conta da chuva que caiu desde quarta-feira

Assim, em meu quarto dia de efetiva navegação, havia se encerrado dentro de um consultório de uma dentista em Ilhabela...



Boa navegação à todos!

Capitão Amador Gutemberg
Comandante da embarcação Rei dos Reis

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Ilha Anchieta

Diário de Bordo - 10 de fevereiro de 2009 - 3ª feira

Acordamos cedo no Saco da Capela, Ilhabela e com céu de brigadeiro e mar de almirante levantamos o ferro e colocamos a proa no azimute de Ilha Anchieta - a ilha mística.


O Gutinho tinha ido sentar-se na proa e apreciar a viagem (isso ele faz como ninguém) e o Ricardo sentou-se no guarda-mancebo [já imaginaram a quanto tempo foi criado essa palavra - mancebo - a maioria dos leitores nem sabem o que significa, lá vai: de acordo com o idicionário Aulete - (man.ce.bo) [ê]
sm.
1. Indivíduo do sexo masculino que está na juventude; JOVEM; MOÇO; RAPAZ
2. Homem que vive em mancebia, em concubinato; AMÁSIO
3. Bras. Cabide para roupa, formado de uma haste com diversos braços
4. Bras. S Pedaço de pau ao qual se penduram candeias
5. Diz-se de indivíduo jovem, moço
6. Próprio da mocidade; JUVENIL
7. Em que há vigor, energia; ENÉRGICO; FORTE
[F.: Do l at. mancipus, de mancipium ?ação de adquirir ou tomar na mão? ?ext. escravo?, de manceps (de manus + capio).]

Voltando ao texto, o Ricardo ficou sentado ao meu lado no guarda-jovem (rs) e fomos conversando. No turbo de BE estava com 0,5 Kg e no de BB 1,0 Kg e equalizei no giro e toquei. Próximo da Ilha do Mar Virado, vimos ao longe um grupo de golfinhos esfomeados, que pularam rapidinho para fora para pegar ar e mergulharam novamente e até onde fomos observando não subiram mais. Que pena, não deu para fotografá-los. Mas na verdade queríamos mesmo era cruzar (de bem longe, claro) com uma baleia. Já pensou conseguirmos fotografar uma Jubarte...

Com Ilha Anchieta em nossa proa, fomos navegando a 17 nós. Estava me sentindo em meu futuro trawler, dentro de uma lancha com dois MWM de 260 cada que atinge fácil 30 nós. De qualquer forma, me sentia o próprio Popeye. Só faltava o cachimbo...

Quando assustei, cadê o Gutinho. Comoção geral a bordo. Ricardo saiu rápido por um lado eu por outro, olhei atentamente para a popa para ver se o localizava na esteira do barco e já ia dando a volta quando o Ricardo gritou:

_ Tá aqui...no fly...

Adivinha? Dormindo. Brincadeira! O cara tem uma capacidade impressionante para dormir, e não ache que não consegue dormir a noite. É um belo discípulo de Morpheu.

Passado o susto, entramos devagarzinho na pequena e bela enseada da Praia do Sul, lançamos a âncora e fomos de ré até bem próximo da praia. Falei para o Gutinho fazer contato com os nativos, ou melhor, um senhor que ali estava rastelando a praia e ver a possibilidade de pernoitarmos na pequena enseada. Quem disse que o Grande Guerreiro se atreveu a desembarcar e falar com o dito cujo do homem.

Lá fui eu, provido de toda coragem dos portugueses ao desembarcar em terras estranhas.

- Bom dia, será que o Sr vê algum problema em pernoitarmos na enseada?

- Melhor o Sr falar com aqueles pessoal (sic) ali. São da segurança.

Xiiii - segurança?? pegou...

Untada a cara em verniz naval, lá fui.

- Bom dia, quem é o camandante por aqui? Os dois mais novos logo apontaram o senhor de cabelos totalmente brancos, longas barbas, nonezinho de sei-lá-oque na cabeça e como os demais apenas de calção.

- Sou subtenente da nossa polícia militar, gostaria de saber se haveria problemas de pernoitarmos aqui na enseada, eu, meu filho e nosso marinheiro?

- ÔÔÔ muito prazer seu moço. Acho meior (sic) o Sr fazer o pernoite no outro lado, no saco das Palmas (juro que entendi na hora Saco das Almas - com todo misticismo da ilha, o nome seria ideal - rs).

Olhando atentamente, sem desviar olhar, percebi que um dos mais novos estava com uma bermuda da PM, do uniforme de verão.

-Ô chefe, também sou da PM, sou soldado responsável pelo destacamento local.

Rapaz, destacamento da PM numa ilha. Muito chique. Adorei!!!!

Feitas as apresentações e cumpridos os protocolos, enturmei e começamos a fazer um determinado escambo. Eu fornecia cervejas geladas e eles (menos o PM) as batidinhas de tudo o que vocês imaginarem - tudo meso. Batida de limão - vixxxiiii, tinha; batida de maracujá, também; batida das duas misturadas que descobri se chamar brasileirinha, idem e só foi aumentando a lista. De repente um deles se levanta vai até um pé de goiaba, mais conhecido por goiabeira (vermelha) e de repente batida de goiaba na mesa, Muito chique de mais... Jambolão, coco, bolacha (pode rir mais é verdade, provamos mais tarde), de ovo (eghhh, essa não tive coragem, mas teve gente que bebeu). Faltou de palmito ou de samambaia brava...rs.

Seo Joel, como se chamava o comandante da Ilha, vinha com uns peixinhos que pesca ali mesmo, fritinho na hora e lá se foi.

Dada umas horas, os dois mais novos (o PM e o Vigilante) foram para o outro lado da ilha (não o de baixo) por conta das visitas que começariam a chegar por causa do ex-presídio que ali existiu e foi pauco de um dos mais sangrentas rebeliões que o estado já teve. Foram mortos vários polciais militares que ali trabalhavam e moravam com suas famílias (mulheres e filhos), o Diretor da época, e até presos que tentaram impedir violência contra mulheres dos policiais e funcionários civis.

Depois disso, a ilha ficou abandonada e depois ainda foi transformada em área de proteção ambiental e parque estadual, e agora é habitada por fantasmas dos falecidos e até por ETs. Pelo menos é o que me garantiram por lá.


Quase anoitecendo, obedecemos a voz da experiência e fomos nos recolher na baia das Palmas. Desembarcamos e pudemos tomar um banho quentinho no chuveiro do destacamento, com a devida autorização, claro.


Depois fomos ao alojamento dos vigilantes onde experimentamos outras especies de batidas e pronto, fomos até o refeitório da Ilha para jantarmos arroz, feijão (olha que luxo) e linguiça frita, acompanhado de uma limonada de limão vinagre. Delícia de refeição. Para nós que já estávamos no mar, de certa forma, desde sábado, comer algo parecido com refeição de casa foi uma dádiva.

Após o jantar, desfrutamos das histórias e estórias da famosa rebelião, onde um dos líderes se chamava Jorge Floriano, conhecido pela alcunha de China Show e teria cometido atrocidades. Com relação ao nome do dito cujus, consta que não seria de decendência oriental e não encontrei no livro do Tenente Samuel Messias de Oliveira, intitulado Ilha Anchieta - rebelião, fatos e lendas, de quem ganhei um exemplar em visita anterior àquela ilha, sem nunca imaginar que um dia estaria ali, de novo, por meios próprios e ainda fazendo coisas alheias aos simples turistas. No livro ganho, o autor dedica: para meu irmão de armas, tenente Gutemberg, esposa Rita, filhos Felipe, Gutemberg e João Pedro, um abraço do autor, Ilha Anchieta, 06/01/07. Se passaram dois anos e quatro dias desse presente.
Embarcamos novamente e decidimos mudar o barco de lugar, indo um pouco mais a direita de onde estávamos. Escuridão completa. Nunca tinha imaginado que o mar a noite fosse tão escuro quanto nas matas. De qualquer forma, fomos em velocidade bastante lenta, liguei o farol de busca e fomos atrás de uma bóia que os colegas da segurança afirmavam que existia.

Por volta das 23:oo hs, conseguimos nos contentar com o lugar que iríamos pernoitar. Fechamos o barco e dormimos.


Com exceção de alguns que sonharam com o tal China Show, a noite foi só de tranquilidade...só o barulho do mar no costado da embarcação. Fiquei pensando por que transformaram aquele paraíso em inferno, tornando-o num presídio...




Boa navegação à todos!

Capitão Amador Gutemberg
Comandante da embarcação Rei dos Reis

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Cruzeiro em fevereiro de 2009 - Ilhabela

Diário de Bordo do dia 09 de fevereiro


Segunda-feira


Logo pela manhã, depois de um final de semana inteiro em preparação para zarpar, recebi a visita do Vavá e do Adailton que queriam se certificar que estava tudo ok com o concerto do turbo do motor de BE. Fizemos um pequeno passeio pelo canal e pareceu tudo dentro da conformidade.

Assim, deixei nossos visitantes no pier do Pier XV e nos despedímos, com uma sequência de buzinadas que foram correspondidas com acenos pelos que estavam no pier e pelos demais marinheiros na rampa...que lindo, quase chorei. Fiquei imagiando quando for fazer um cruzeiro de um ano...


- "Delta 45 é a Rei dos Reis!";

- Rei dos Reis bom dia, canal 74:

- Canal 74 - subindo;

- Delta 45 é a Rei dos Reis, deixando Pier XV com destino à Ilhabela, Ilha Anchieta e Parati-mirim. Comandante da embarcação Capitão Gutemberg, Marinheiro Ricardo e um passageiro. Previsão de retorno para sábado, 14, por volta do meio dia;

- Rei dos Reis confirmado, boa viagem, mar calmo com vento suave de NE, ondas de 60 cm a 70 cm. Um bom passeio a todos.


Dentro de nosso planejamento, passaríamos para reabastecer, completando os tanques no Vindomar e tomaríamos o azimute para Ilhabela, nossa primeira escala e primeira perna da viagem. Próximo do posto nossa primeira surpresa: o posto estava fechado. Fomos pouco a frente e o posto da Nacionais não tinha diesel. Nos entreolhamos e começamos a rir. Nossa viagem ia ficar comprometida a míseros 3 Km de navegação.


De repente o Ricardo falou que viu um dos abastecedores da Vindomar no posto, retornamos devagarzinho para não pagar muito mico, mas era verdade. Ufa!!! a viagem estava salva. Abastecemos até o talo.


Nosso GPS da embarcação, não sei por que cargas d'água decidiu fazer greve e se desligou e não consegui mais fazê-lo funcionar, mas como tenho sempre mais um, não havia problemas.

Rumamos para a saída do canal e à cada embarcação que passávamos dava vontade de gritar que iríamos nos aventurar pelos mares do sul (calma, nem tanto, só um pouquinho). Tive até a impressão que uma moça que passava pela balsa nos acenou com um olhar de saudades...


Na saída do canal vi que o mar de fato estava muito tranquilo e decidido a colocar em prática os ensinamentos de nosso professro Fábio Reis, comecei a navegar pela bússula e pela carta náutica. Tirei a coordenada e o azimute e com a calunga que tinha feito na noite anterior, joguei 110° de proa e prossegui. O pior que poderia acontecer seria atropelar o Montão de Trigo - pensei, uma vez que não havia grande distância de visibilidade. Mas o professor é muito bom e o aluno nem tanto, mas dá suas cacetadas. Passamos ao largo do Montão e ajustei o azimute e assim chegamos à Ilhabela, no saco da Capela, nas bóias do Almir - Base Mirella. Como não toinha ninguém na base, pegamos a que nos melhor pareceu e amarramos nosso cabo de proa. Rapidinho o Ricardo conseguiu liberar a água e lavamos o barco e reabastecemos nosso tanque de água doce.


A primeira perna da viagem estava cumprida sem maiores incidentes.


Já pelas 17:30 hs fomos sentar na proa e recebemos a visita ilustre de uma tartaruga comedora de algas.


Naquela paz e quietude de uma segunda-feira marvilhosa de sol, fomos ficando por ali, conversando amenidades e fazendo planos para o dia seguinte (mal sabiam eles que já estava tudo planejado por mim, claro!)


Fomos nos deitar já bem tarde. Eu apenas depois de me certificar que estava tudo certo e de checar novamente a carta com a derrota traçada. Medi e fiz de novo a calunga, ok!

Fui deitar e fiquei pensativo por algumas horas. Agradeci muito a Deus aquela oportunidade de estar ali e senti muita falta da Rita. Ela sempre tem alguma coisa para falçar na hora que vamos nos deitar...rs.

O barulho da maré no casco é hipnotizador. O Gutinho ia longe no sono e o Ricardo ainda se mexia na beliche. Descobri depois que ele nunca tinha viajado assim e já sentia saudades da casa (especificamente, como comprovei depois, de sua cama).



Boa navegação à todos!

Capitão Amador Gutemberg
Comandante da embarcação Rei dos Reis